Se não estás, também não estou. Se não és, também não sou. Se não vais, também não vou. Sempre foi assim ... Todos os dias carrego em mim o pouco de mim que sobrou e muito de ti que ocupou, sem nunca te procurar. Encontro-te em todas as esquinas, em todas as mesas e músicas lamechas. Em todas as fases da lua, pores de sol e calçadas de Lisboa. Sem precisar de experimentar não estar do teu lado. Antes foi assim. "Os defeitos nunca são maiores que nós, juntos", disseste-me.
Experimenta estares sem nós antes de falares que sou um peso. Tu não o dizes, falas. Tu sem voz. Nunca precisaste de procurar-me. Estou em todas as tuas mesas, esquinas, músicas, fases da lua e pores do sol, sempre estive. Até a minha ausência pertence-te. Experimenta falares comigo e eu não estar para te ouvir. Experimentar meter os meus defeitos numa mão e a falta que eles te fazem noutra.
Se não estás, não quero estar. A angustia de não ouvir a tua voz é mais forte que o som das minhas lágrimas no chão que pisaste. A tua ausência sente-se mais. O teu lugar é aqui. Aqui. Se não estás, deixo de saber onde quero estar. Experimenta fechares as mãos e não me teres para abraçar. Experimenta cair e quando te levantares não me teres a olhar docemente para ti. Experimenta deitares-te para dormir e não teres uma mensagem de "bons sonhos" minha.
"Conheces alguém que quando fala diz tudo certo?". Conheço, retorqui. Tu eras assim para mim, perfeito aos meus olhos e mesmo quando não eras, as tuas palavras eram. Se te colocar nas mãos cabes nas duas, sem te dividir. Sem ter de balançar entre o que és de bom e o que és de mau.
O teu silêncio ensurdece-me. Eu sei, já o experimentei. "Lembra-te, os defeitos nunca são maiores que nós, juntos", repetiste. Não sabes o peso da minha ausência na tua vida agora que me conheceste. Eu sei o peso da tua ausência na minha vida, experimentei-o. É como não ter vida, é ir vivendo até te encontrar de novo e me perder de novo no teu olhar controverso. Em todas as esquinas do meu pensamento.
Um dia irei partir para que possas sentir a minha ausência. Dentro de mim, continuarei a carregar-te, mas já não estarei em nenhuma mesa, calçada, esquina e música para me encontrares. Dentro de ti serei apenas a mágoa e angústia de algo que passou e não ficou ...
"Façam o Favor de Ser Felizes"- Raul Solnado